quarta-feira, 22 de maio de 2013

Trecho da entrevista com Donnie Cesar Correia ao blog RF referente a questão do aborto.

  Fraternas, dando continuidade as “Entrevistas com os Homens”, segue as palavras do Administrador de Empresas Donnie Cesar Correia, nato e residente em Unai / Minas Gerais, autor e administrador do blog Moinho Labirinto e moderador da comunidade do Orkut já extinta Machismo Esclarecido.



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SZ: Quando diz que o aborto é consequência mecânica de diversos níveis de violência social, descaso e patrimonialismo legal,está se referindo a quê, poderia nos esclarecer mais sobre isso?
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Donnie Cesar: Perfeitamente. Patrimonialismo refere-se ao tratamento da res publica como propriedade privada - é a apropriação indébita do que é de todos. No contexto legal isso se refere a um conjunto de normas que toma do espaço público e democrático autoridade para uma minoria que trata aqueles direitos como "vantagem" sobre as demais classes. O fato de vários homens, mesmo atendendo às qualificações necessárias, serem frequentemente negados à guarda de suas crianças em detrimento de mães desequilibradas e sem os recursos financeiros para arcar com os custos da criação das crianças é um tipo de patrimonialismo legal.
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Esses "pedaços de direito" são disputados à tapa por todos os segmentos da sociedade porque historicamente a sociedade brasileira é uma sociedade de castas, raças e divisões. Essa disputa cria uma situação de violência que começa no berço e que pauta como crescemos - e há quem lucre muito com isso. Nossa sociedade é competitiva e violenta por natureza - ela reflete uma condição antropológica de escassez e "lei do mais forte".
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A título de exemplo, o número de mulheres chefiando lares aumentou exponencialmente no Brasil, assim como a família nuclear deixou de ser um panorama genérico - e ainda assim, existe um preconceito imenso contra a mulher chefe de lar. Nossa formação social marginaliza essa mulher e deixa esse estigma como herança para seus familiares.
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A mulher que aborta frequentemente – ainda que não represente a totalidade dos casos, como eu disse - se vê num estado desesperador: por um lado, todas as pressões sociais e morais do aborto. Do outro, a perspectiva de criar uma criança e falhar, uma cobrança histórica sobre a mulher apenas. Por um lado o avanço da gravidez que muitas vezes a fará ficar desempregada - eu trabalho com Recursos Humanos e sei que a segurança trabalhista da mulher grávida é só um prêmio de consolação para uma demissão que quase sempre virá. A questão do aborto é extremamente sensível para a mulher.
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Se a gravidez, desejada ou não, fosse tratada com clareza e sem preconceitos seria possível conciliar panoramas muito mais promissores: imagine um casal que deseja adotar um bebê, poder acompanhar a criança desde a gestação, sem preconceitos para nenhuma das partes. Utópico? Não acredito. Creio inclusive que seria mais barato reformar completamente o sistema de adoção brasileiro e a criação de unidades especializadas de suporte à mulher do que aparelhar o SUS a lidar com toda a demanda desse tipo de processo. Analisando as estatísticas friamente, a possibilidade de a agenda feminista triunfar no Brasil é substancial. Parece-me, entretanto, que alcançar melhores indicadores nos quesitos acima é essencial para impedir um massacre.
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SZ: Acredita que o maior índice de nascimento e mães solteiras está em qual classe social e que o aborto é mais praticado pelas mulheres mais pobres do que pelas mais abastadas materialmente?
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Donnie Cesar: Não é um caso de "acreditar". Infelizmente nossos dados sobre aborto são extremamente imprecisos devido à clandestinidade, clandestinidade essa que é lucrativa como consequência do quadro acima, isso, claro, considerando que existem diversas estatísticas tendenciosas sobre o assunto.
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As mulheres mais abastadas frequentemente possuem os recursos para recorrer a clínicas clandestinas de "qualidade" superior (um termo repulsivo nesse contexto, mas necessário). As mulheres de classes econômicas menos aquisitivas normalmente precisam recorrer a doar as crianças ou compartilhar sua criação - algo que é prática quotidiana no interior do Brasil. As mães solteiras que chefiam famílias arcando com os custos totais de seu domicílio normalmente pertencem à classe média. O aborto é menos freqüente nas classes C e D por causa dos riscos inerentes ao mesmo, mas ainda acontece - é normalmente o que aparece nos assustadores dados da morte feminina devido a tentativas falhas de aborto.
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SZ: No seu discernimento quais seriam as soluções para a erradicação da prática de aborto das mulheres de baixa renda e das mais abastadas economicamente?
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Donnie Cesar: Eu não creio que qualquer mulher de bem veja o aborto com bons olhos – não falo aqui da legalização da prática, mas da prática em si. Eu conheço um número significativo de pessoas que não são contra a legalização, dentro de vários termos, mas que ainda pensam na prática como algo abominável. Uma discussão importante é o aspecto moral e psicológico do aborto, para os quais não há legalização ou solução fácil.
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Pensando no bem da questão como um todo, para mim é necessário federalizar o sistema de adoção e modernizar o processo de cadastro das crianças e de fila giratória de adoção. Para o pré-natal, no sistema de saúde, é necessário ter a possibilidade de dizer claramente ao médico que não quer a criança e que vai oferecê-la para a adoção. A partir dessa fase, inicia-se outra, de suporte e acompanhamento psicológico e médico que segue durante a gestação até o nascimento da criança.
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Eu não creio que os números do aborto seriam sequer parecidos com os atuais se a criança não fosse vista, desde o início como "o problema com o qual é necessário lidar" e sim como "o filho que eu não posso criar, mas que será bem cuidado e que terá com outra família um universo de possibilidades". Após o parto e a adoção, é necessário ainda aconselhamento e suporte para o planejamento familiar, para evitar a reincidência.
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Em minha opinião, a questão da legalização do aborto é pequena quando comparada com o oferecimento de saúde real e alternativas de cidadania à mulher grávida que não deseja ter a criança. Legal ou não, o aborto é uma escolha da qual a maior parte das mulheres se ressente por toda a vida. A função do estado democrático não é limitar as opções da sociedade civil - é dar a ela a chance de fazer as melhores escolhas para todos os envolvidos - isso é sinergia.
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Atenciosamente.
Donnie.
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==================================================Símia Zen.

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